1/8/2024 a 11/8/2024
Jazz em Agosto de regresso à Fundação Calouste Gulbenkian
Entre 01 e 11 de Agosto
A 40ª edição do Jazz em Agosto começa com a declaração de amor a Mahalia Jackson, por James Brandon Lewis e os Red Lily Quintet, e acaba com a imperdível atuação da Fire! Orchestra.
cardapio.pt @ 26-7-2024 10:59:22
Pelo meio, atuam o guitarrista Bill Orcutt, o trompetista Peter Evans, Ava Mendoza, Darius Jones fLuxKit e Beatnik Generation, entre muitos outros, deixando claro que o legado do festival é a soma de todas as partes e que o passo seguinte procurará ser sempre mais disruptivo que o anterior, ou simplesmente diferente.
Evento organizado pela Gulbenkian Música e Fundação Calouste Gulbenkian.
1 de Agosto, 21:30 > James Brandon Lewis / Red Lily Quintet
A música carrega sempre uma intensidade suplementar quando parte de motivações íntimas. No texto que fez incluir no álbum For Mahalia With Love, o saxofonista James Brandon Lewis escreve uma carta a Mahalia Jackson, confessando sempre se ter questionado como teria sido a experiência da sua avó ao assistir, em criança, a um concerto da mítica cantora gospel e ativista dos direitos civis. Com o Red Lily Quintet, o músico alimenta-se de várias linhagens aqui justapostas: a familiar, a respeitante à luta contra o racismo, a que respeita à sua filiação jazzística. Depois de duas auspiciosas atuações no Jazz em Agosto, com os Heroes Are Gang Leaders e com o seu quarteto, Brandon Lewis regressa à frente de um quinteto de luxo e sob a influência de uma das maiores vozes da música norte-americana.
2 de Agosto, 18:30 > Espvall Rocha Lobo
Um dos grandes aliciantes da música improvisada é que a simples enumeração dos músicos envolvidos pouco mais oferece do que algumas pistas soltas sobre aquilo que criarão em conjunto. No caso deste encontro entre a guitarra magnética de Norberto Lobo, o violoncelo de grande amplitude de Helena Espvall (da folk ao jazz vanguardista) e o violino que caminha na tangência entre música clássica e experimental de Maria da Rocha, na sua segunda apresentação pública, aquilo que podemos adivinhar é apenas a atração que os três partilham pela melodia e pelo seu reverso (na facilidade em desfazer e construir mundos no espaço de curtos segundos). Uma viagem tão imprevisível quanto entusiasmante, ou não fossem estes três músicos capazes de uma surpresa constante e milagrosa.
2 de Agosto, 21:30 > Mendoza Hoff Revels
Na primeira de três atuações neste Jazz em Agosto, a prodigiosa guitarrista norte-americana Ava Mendoza apresenta o projeto que encabeça juntamente com o baixista Devin Hoff, inspirado no amor que partilham por referências tão díspares quanto o hardcore dos Black Flag e o jazz-funk do Prime Time de Ornette Coleman. A palavra de ordem é eletricidade e o resultado, segundo os próprios e na companhia de James Brandon Lewis e Ches Smith, corresponde a um “rock progressivo do século XXI tocado por punk rockers com sério talento para a improvisação e um profundo sentimento de jazz”. Mais do que as palavras possam alcançar, trata-se de um completo assalto aos sentidos, um pungente abanão em quaisquer certezas musicais, que a National Public Radio (NPR) elegeu como um dos momentos mais altos de 2023.
3 de Agosto, 18:30 > Sylvie Courvoisier & Cory Smythe
Em digressão com Israel Galván, ao ver todas as noites o bailarino de flamenco colocar-se numa posição que lhe lembrava o histórico Nijinsky e o bailado revolucionário Sagração da Primavera, Sylvie Courvoisier começou a inserir citações da música de Stravinsky no espetáculo. Foi o ponto de partida para um aprofundamento da sua relação com a obra-prima do compositor russo. Neste concerto, tal como no album The Rite of Spring – Spectre d’un songe, Courvoisier interpreta com Cory Smythe um arranjo da obra para dois pianos, após a qual os dois pianistas, de natural propensão para a improvisação, se debruçam sobre uma composição da pianista suíça inspirada pela criação de Stravinsky. Foi-se o escândalo com que a obra original foi recebida em 1913, mantém-se o espanto que continua a despertar.
3 de Agosto, 21:30 > Bill Orcutt Guitar Quartet
Num dos mais belos e insólitos álbuns dos últimos anos, Bill Orcutt gravou-se a tocar quatro guitarras, montando um puzzle de vários registos circulares e minimalistas na guitarra elétrica. As comparações com Steve Reich, mas também com obras de Satie e de Bach, haviam de seguir-se, dando pistas para a entrada num universo que multiplicava o estilo singular de Orcutt por quatro e unia os distintos interesses que, na década de 1970, o empurraram para a música: o punk e o pós-punk, o jazz avant-garde de Cecil Taylor e do Art Ensemble of Chicago. A vontade de dar vida ao disco em palco levou Orcutt a reunir um magnífico quarteto – que integra os talentos de Ava Mendoza, Shane Parish e Wendy Eisenberg – com o qual recria as suas composições e se aventura em terreno totalmente desconhecido.
4 de Agosto, 18:30 > Ava Mendoza & Gabby Fluke-Mogul
Na terceira atuação neste Jazz em Agosto, Ava Mendoza junta a sua indomada guitarra ao violino disruptivo de Gabby Fluke-Mogul. Mendoza há muito que se tornou um nome essencial à música exploratória atual, tratando a guitarra como um instrumento abrasivo, tão confortável em cenários de rock destemido, quanto em ambientes de improvisação livre e sem rede, editando com frequência pela Tzadik de John Zorn. Fluke-Mogul partilha com a guitarrista a proximidade de músicos como Fred Frith e Zeena Parkins, tendo sido descrita como “o som mais arrebatador na música improvisada em vários anos”. Após algumas parcerias com outros músicos em quarteto, as duas assumem um duo visceral, num passeio constante à beira do abismo.
4 de agosto, 21:30 > Lucas Niggli Tentet
Lucas Niggli não é estranho à história do Jazz em Agosto, tendo passado pelo festival como parte do explosivo trio Steamboat Switzerland. Mas se o imaginativo baterista tem espalhado o seu fogo por numerosos projetos e colaborações (sobretudo com Barry Guy), o caminho que escolheu para o grupo Sound of Serendipity, com edição pela criteriosa Intakt Records, é toda uma revelação: Niggli convoca este decateto para uma composição operada por um jogo de cartas, sempre na fronteira entre a música escrita e a improvisação, sempre no fio da navalha. É uma torrencial fonte de originalidade, imprevisível, abastecida pela seleção nacional suíça dedicada à improvisação. A bateria comanda, sem medo do groove, e flauta, voz, acordeão, tuba ou órgão orbitam num espetacular remoinho à volta de Niggli.
5 de Agosto, 21:30 > MOVE
Formado pelo baterista português João Valinho e pelos músicos brasileiros (radicados em Portugal) Yedo Gibson no saxofone e Felipe Zenicola no baixo elétrico, Move é um trio cuja música, como escreveu o jornal Público, “parece caminhar em permanência sobre estilhaços de vários géneros”. Significa isto que há pedaços de jazz, funk, kuduro, punk, frevo, heavy metal e breakbeat em atropelo, tudo sugestões que nunca chegam a assentar, numa prática de constantes guinadas estilísticas e de insatisfação permanente. Música de uma liberdade inegociável e de uma refrescante recusa em fixar-se em qualquer lugar, alimentada por uma qualidade quase sobrenatural de cada músico em responder aos outros, lançando sempre novos argumentos. Uma viagem estonteante e notável, com a paisagem sempre a mudar.
6 de Agosto, 21:30 > The Selva
The Selva é um trio que junta três dos mais originais e criativos músicos portugueses – Ricardo Jacinto no violoncelo e na eletrónica, Gonçalo Almeida no contrabaixo e na eletrónica, e Nuno Morão na bateria e na percussão. Entre os três circulam evocações de música clássica oriental e de música antiga ocidental, motivos de música tradicional subsariana, rarefações de blues e de jazz, numa busca singular pela beleza que não se deixa apanhar pelas malhas habituais. Pode dizer-se que The Selva é música de câmara em total liberdade e de potencial hipnótico. No Free Jazz Blog, Paul Acquaro descreveria “a lenta construção de momentos musicais” no último álbum Camarão-Girafa como “apaixonante e a exigir audições repetidas”. Um mistério que hesita, admiravelmente, entre esconder-se e revelar-se.
7 de Agosto, 21:30 > Brandon Seabrook Trio
O trio liderado por Brandon Seabrook, fundado no eixo Nova Iorque-Detroit, trabalha com paisagens alucinatórias, um humor cortante, recorrentes mudanças estéticas e de registo. Acompanhado por Gerald Cleaver (bateria e eletrónica) e Pascal Niggenkemper (contrabaixo), Seabrook explora zonas pouco frequentes na guitarra e, sobretudo, no inusitado banjo que traz para esta formação. “É um desafio extrair diferentes texturas deste anacrónico pedaço de madeira coberto em metal de 1927”, disse sobre o instrumento em entrevista à revista Vice – a mesma que lhe chamou “apocalíptico destruidor do banjo”. Porque aquilo que Seabrook faz com uma guitarra ou um banjo nas mãos, secundado pelos seus excecionais companheiros, é levar os instrumentos para lugares inéditos, onde são quase irreconhecíveis.
8 de Agosto, 21:30 > Darius Jones fLuxKit Vancouver
fLuxKit Vancouver é uma espantosa composição do saxofonista Darius Jones, dividida em quatro movimentos e resultante de uma encomenda do centro de artes Western Front, em Vancouver. Em parte, Jones basear-se-ia no pensamento dos artistas do movimento Fluxus, em especial na importância atribuída ao momento e ao questionamento das várias disciplinas, pontuando a partitura com deixas gráficas que apontam para o recurso a técnicas estendidas usadas pelos instrumentos de cordas. “Olho para a improvisação como uma multitude de sons e isso informa a maneira como penso enquanto compositor e improvisador”, explicou à The Wire. Com fôlego de suite e assumida dimensão narrativa, esta é uma peça que, sugere a revista, se liga tanto “ao fervor revolucionário do Fluxus” como “ao poder espiritual da criação coletiva”.
10 de Agosto, 18:30 > Made of Bones
Nascidos dos Slow Is Possible, sexteto português que explorou com enorme criatividade a ligação à música cinemática e a assumida herança de uma implosão de géneros na linha dos Naked City de John Zorn, os Made of Bones alimentam-se de algumas das mesmas premissas para repensar em quarteto as possibilidades do jazz enquanto música feita de uma miríade de géneros e sem destino definido. A cada momento, em cada esquina, tudo é uma possibilidade e, nesta constelação, a secção rítmica acústica esgrime em permanência com a eletricidade crepitante que faísca das notas da guitarra e do piano ligados à corrente. Música radicalmente espontânea, em que o jazz, o rock e a música exploratória são referências usadas para dinamitar todos os limites que possam surgir-lhes ao caminho.
cardapio.pt @ 26-7-2024 10:59:22
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