Museu de Arte Pré-Histórica e do Sagrado do Vale do Tejo debateu "O património cultural de Mação e o turismo sustentável"
O Museu de Arte Pré-Histórica e do Sagrado do Vale do Tejo associou-se ao Dia Internacional dos Monumentos e Sítios promovendo um debate sobre as potencialidades do património cultural de Mação associado a atividades de turismo sustentável, ou seja, sobre novas iniciativas associativas e privadas que podem ser promovidas, divulgando o património sem colocar em risco a sua integridade e conservação.
cardapio.pt @ 24-4-2017 11:58:33
Integrado nas comemorações do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, a sessão, que decorreu em Mação no passado dia 18 de abril, contou com as intervenções do presidente da Câmara de Mação, Vasco Estrela, do diretor científico do Museu, Luiz Oosterbeek, do historiador João de Matos Filipe e do coordenador da associação Pinhal Maior, Augusto Nogueira.
O leitmotiv da discussão centrou-se nas dificuldades e no problema da perda de população nos territórios ditos de ‘interior’, tendo o presidente da autarquia, Vasco Estrela, questionado “como é que o território pode ser um fator de riqueza”, e “como é que o património entra” nessas contas.
“É preciso perceber como é que o nosso maior património, como o cavalo do Ocreza, pode contribuir para a valorização do concelho. Há o receio do diretor do museu sobre o vandalismo, mas deve ser possível compatibilizar. Outro património, e este muito maltratado, é o rio Tejo: [importa saber] como o aproveitar sem perder o que ele tem de mais-valia”, referiu o autarca, como pontos de discussão.
O historiador João de Matos Filipe, por sua vez, defendeu que "todos deveriam pensar sobre quais as potencialidades do Tejo, e o que podemos fazer com isso".
"O Tejo sempre foi referência, e devíamos articular. Nunca a área do Tejo esteve tão natural como agora", defende Matos Filipe, pois "a agricultura eliminava tudo". Hoje, "a fauna recompõe-se face ao renascer das lagoas, etc. Os milhares de euros que se gastam no Alqueva, sem grande sucesso, quando aqui seria mais fácil..." Em seu entender, "a sustentabilidade carece da consciencialização das comunidades sobre como esse património é delas”. O coordenador da Pinhal Maior, Augusto Nogueira, defendeu que “é melhor pensar o impossível porque a concorrência é menor". As prioridades, diz, "são como paixões: passam". Há uns anos, confessa, "preocupava-me com alcatroar as estradas, não com o património; não fui educado para isso", explica. "A sustentabilidade eram as terras. Hoje pensamos de outra forma, e as prioridades mudaram. O livro sobre o berço da Lusitânia inscreve-se nisto, pegando no património de forma apelativa. Em vez de fazermos feiras medievais, como todos, porque não fazer uma festa dos lusitanos?”, desafiou.
"Há uns anos preocupava-me com alcatroar as estradas, não com o património; não fui educado para isso."
Augusto Nogueira, Coordenador da Associação Pinhal Maior
O investigador de história local Carlos Gueifão é apologista de “uma maior comunicação para envolver mais pessoas”, tendo observado que, na sua opinião, há é que é saber qual é a nossa prioridade. "Será o turismo? Não. Mação mais vivo? Há 50 anos havia essa discussão e sabia-se quais eram os objetivos (estradas, comunicações, água, luz). E hoje? Não sabemos, mas se fizermos o debate, chegaremos lá. Ninguém visita uma terra. Mas o que pode atrair massas é a região”.
Pedro Cura, arqueólogo, defendeu uma visão do património “de forma integrada, e não como passagem". Não defende que se promova um território "para virem cá apenas uma vez", mas para voltarem. "Há um património fundamental, que são os saberes que ainda persistem. O maior problema desta e de outras regiões é o êxodo”, defendeu.
Também a arqueóloga Sara Cura interveio no debate, tendo defendido que “os espaços de memória são um exemplo de como se pode promover a consciencialização”.
Vasco Estrela levantou novamente a questão: “Como é que vamos preservar todo esse património? Basta pensar nas igrejas, porque não há dinheiro. É o caso dos sítios HERITY. Outro exemplo: a DGPC decidiu que haverá dez sítios a valorizar, não perguntando aos municípios se tinham a verba que lhes corresponde. O livro da Lusitânia foi uma aposta e precisa de apoio na pesquisa. É um caminho. O Médio Tejo perdeu 1500 pessoas entre 2015 e 2016. As ZIFs são um instrumento para suster o despovoamento. O património é um dos instrumentos essenciais para isso”, defendeu.
"O Médio Tejo perdeu 1500 habitantes entre 2015 e 2016. A promoção do património também é fundamental para inverter o despovoamento."
Vasco Estrela, Presidente da Câmara Municipal de Mação
Para João Filipe, “falta que pensemos em conjunto, e focar os objetivos”. Segundo defendeu, “as rotas pedestres são um instrumento essencial. Temos perdido em demografia, mas ganhamos em valor: aqui as pessoas têm nome. São valores imateriais que temos de promover”.
Luiz Oosterbeek, diretor científico do Museu de Mação, destacou a importância de ter haver debate, e de existir um plano estratégico de desenvolvimento. “Há várias frentes (museu, zifs, empresas de aldeia, ensino, floresta) mas falta um foco, porque estamos no ciclo que se pode tornar vicioso, que tem a ver com a renovação de gerações. É preciso também comunicar. Há muita atividade com o museu, mas não chega. Totalmente de acordo com a valorização turística. O investimento foi feito na infraestrutura e na investigação, que continuam. Falta a operacionalização, que carece do setor privado, falta uma maior articulação intermunicipal e falta também contornar alguns limites das leis no esforço público, que se aplicam por igual a realidades distintas (exemplo: guiar os carros). Hoje iniciámos uma discussão sobre a melhor calendarização de atividades, incluindo eventos que atraem pessoas. Era bom que se formasse uma associação de amigos do Museu, em defesa ativa do estudo, conservação e fruição do património. É preciso também gerir o património na ótica do território e não da preservação integral."
"Se Portugal chegar aos 6 milhões [de habitantes], ou temos o início de uma guerra no Sul da Europa ou mudamos a estratégia e vai-se repovoar o interior."
Luiz Oosterbeek, Diretor Científico do Museu de Mação
Além disso, Oosterbeek defende que "seria importante discutir de forma articulada a concentração de esforços em alguns focos (ex: HERITY, que devia conjugar os municípios, a Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo, etc.)" e que é necessário "usar as marcas", sendo que "aqui a UNESCO é fundamental". Precisamos, diz, de ser “boa notícia”. E deixa o desafio: "Porque não um grande 'Escolas e Memória', com um tema “Do Tejo à Serra: saberes, memórias e futuro”, envolvendo todas as escolas do Pinhal?"
Quanto ao projeto Lusitânia, entende que é necessário "articular com a pesquisa" e "incorporar a arte rupestre e perceber as dinâmicas no tempo, que estão ligadas à mineração e metalurgia, e não apenas à estratégia militar", considera.
A sustentabilidade, defende, "passa por ligar a dimensão patrimonial a atividades produtivas para além do turismo. É preciso uma estratégia para atrair mais pessoas, com viabilidade total. Uma carteira de oportunidades de investimento ligadas aos pilares identificados é boa. A ideia de património rupestre a património mundial é estratégica. E uma carteira de serviços é fundamental, dos lares às creches. O alojamento é hoje um bloqueio, por exemplo. Uma base de dados de projetos em curso, também era bom termos". Concluindo, deixou o alerta: "Se Portugal chegar aos 6 milhões [de habitantes], ou temos o início de uma guerra no Sul da Europa ou mudamos a estratégia e vai-se repovoar o interior."
cardapio.pt @ 24-4-2017 11:58:33